opinião

Julgamentos e ironias



Mas, afinal, o tríplex do Guarujá (SP) é do ex-presidente Lula ou não? O juiz Sérgio Moro diz que sim. Com essa convicção, a elite da Operação Lava-Jato sustenta que Lula é o "dono oculto" do imóvel, que teria sido repassado a ele como pagamento de vantagem indevida. Oculto é um adjetivo que significa escondido, encoberto, que não está devassado, inexplorado, desconhecido. Por sua vez, a juíza Luciana Correa Tôrres de Oliveira, da 2ª Vara de Execução e Títulos do Distrito Federal, atesta que o imóvel não é do "sapo barbudo do PT". Em 4 de dezembro de 2017, ela determinou a penhora do apartamento 164-A do Condomínio Solaris, no Guarujá (SP), para garantir o pagamento de uma dívida da OAS.

Na realidade, passamos por um período de caça às bruxas ou algumas delas. A pirotecnia policialesca e a busca desenfreada do protagonismo midiático de algumas autoridades do Judiciário invadiram a cena política nacional. Como nunca antes neste país, um partido político, o PT, e uma figura pública, o ex-presidente Lula, são os culpados de todas as mazelas de um Brasil que foi descoberto em 1500. Livros de história podem ser consultados em qualquer boa biblioteca e vão atestar que a corrupção não surgiu com o PT e Lula na presidência. Alguns jornais antigos e sites de internet também podem informar isso.

O PT e Lula erraram, sim, mas tiveram acertos que a elite econômica e social brasileira prefere ignorar por preconceito, raiva e pelo acesso dado às classes menos favorecidas à educação técnica e superior, habitação, bens de consumo, lazer, cultura etc. Como um partido criado na base sindical e com alguns intelectuais de esquerda, tendo um retirante nordestino e torneiro mecânico como líder, pôde fazer mais pelo povo do Brasil do que "a nata econômica do saber"?

Infelizmente, na visão dos "Senhores da Casa Grande", pobre precisa nascer, crescer e morrer como pobre, mero serviçal da elite e a sua inteira disposição. Isso é quase "irretocável" e revela a prepotência, a arrogância e o conservadorismo daqueles que acham-se donos do país.

Desta forma, alijar Lula da disputa presidencial de outubro próximo é o golpe de misericórdia para pavimentar o caminho da vitória do(s) representante(s) da elite e do capital financeiro. Afinal, para as pessoas de bem, "Lula roubou" e "merece ser punido e preso". Mas, e as provas dos crimes cometidos? "Isso não interessa", valem as convicções, os indícios, o diz que diz que, enfim, a intuição da Justiça.

Enquanto isso, a soberania nacional vai à breca, a pobreza e o desemprego aumentam, e o país perde força e representatividade no Exterior. Na grande mídia, no entanto, o "pibinho" vira "pibão", as projeções são sempre otimistas, o país é um celeiro e o setor industrial reage bravamente. A corrupção acabou, pois só havia com o PT, nos governos de Lula e Dilma. A Netflix poderia até fazer uma série sobre o Brasil pós-PT e Lula, abordando "a recuperação do país sob o comando de Michel Temer e cia".

A realidade das telas, e me perdoem pelas ironias, é muito diferente daquela vivida pelos menos favorecidos e aqueles que vão aos mercados, às farmácias, aos postos de combustíveis, entre outros locais. Lembro, ainda, que o salário mínimo subiu 17 reais. Foi de 937 para 954 reais, aumento de 1,81%, o menor em 24 anos.

Diante de tudo isso, eu me apego a uma parte de um texto de Leonardo Boff, que cita Santo Agostinho: "A esperança tem duas formosas irmãs: a indignação e a coragem. A indignação para rejeitar tudo o que se apresenta como injusto e ruim. A coragem para transformar a política do Brasil de ruim e péssima em boa e justa, e refundar um país onde todos possam caber, a natureza incluída."

Manter salva a democracia é um dever de cidadania e justiça.

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